O culto eucarístico fora da Missa é uma prática secular própria da Igreja católica ocidental, largamente desconhecida no Oriente cristão e duramente criticada pelos reformadores protestantes, ainda que hoje, com o movimento ecuménico, a crítica tenha diminuído, devido ao respeito mútuo pelas tradições de cada uma das Igrejas e aos esclarecimentos da autoridade competente.
No século XVI, face aos ataques dos protestantes, o Concílio de Trento, em 1551, interveio a favor do culto eucarístico fora da Missa, afirmando que “não há dúvida alguma de que todos os fiéis de Cristo, segundo o costume que sempre vigorou na Igreja, devem tributar a este Santíssimo Sacramento a veneração e o culto de adoração (latria), que só se deve a Deus”.
Nos séculos seguintes, o culto eucarístico fora da Missa continuou a desenvolver-se e, ao mesmo tempo que se desvanecia o desejo de ver a hóstia, típico da Idade Média, consolidavam-se outras formas de devoção, tais como visitas e exposições, bênçãos e procissões com o Santíssimo Sacramento e também missas diante do Santíssimo exposto, hoje proibidas.
No Século XIX, houve mesmo uma nova explosão da piedade eucarística, um pouco por toda a Europa, mas de forma particular em França, através da criação de ligas eucarísticas, grupos de adoração nocturna e adoração perpétua, “horas santas” e as “quarenta horas”, congressos eucarísticos e a fundação de congregações com a finalidade da adoração e reparação.
Em relação à mentalidade reparadora, própria dos séculos XIX e XX, é certo que a reparação autêntica é a que Cristo realizou de uma só vez e para sempre, mas, unidos a Cristo Jesus, na Sua oferta ao Pai por nosso amor, também a nossa oferta por amor nos faz participantes dos frutos de salvação alcançados por Cristo e que Deus Pai, na alegria do Espírito Santo, quer misericordiosamente distribuir por todos.
Em França, a devoção eucarística renasceu na perspectiva da adoração permanente para reparar os pecados, sempre presentes, da Revolução Francesa: blasfémias, indiferenças, etc., contudo, esta exuberância devocional não se traduziu numa maior participação na comunhão eucarística, que foi sempre baixa (M. Augé).
Pode mesmo dizer-se que o movimento eucarístico cresceu de uma forma isolada do resto da liturgia e muitas vezes até da própria Missa. Embora se encorajasse a comunhão frequente, esta era vista a partir da perspectiva individual da própria santificação; a ligação entre comunhão eucarística e unidade eclesial não era valorizada.
Na evolução histórica do culto eucarístico fora da Missa, houve avanços na doutrina e na piedade que devem ser mantidos e defendidos, mas também houve e há desvios a corrigir para que a plena participação na celebração eucarística reconquiste a sua centralidade. Foi isto que a Igreja fez com a reflexão do II Concílio do Vaticano e também com outros documentos, que esclareceram o contexto doutrinal e pastoral do culto eucarístico fora da Missa.
P. Armindo Janeiro